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quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Polémica "Triagem dos Doentes" - médicos ou enfermeiros? Testemunho pessoal

Este testemunho, tomo-o como uma obrigação.
Em menos de uma semana, um jovem, um grande amigo, de 20 anos de idade, trouxe-me, ao cabo de uma semana de formação política, o assunto. Não tem ainda (espero que nunca a eles chegue!) os vícios da política baixa, reles, mesquinha; tem ainda o sonho de fazer a experiência da política séria, honesta, ao serviço das populações reais que conhece e de que faz parte.
Hoje, num canal informativo da TV, escutei parte de uma polémica disputada entre um alto representante da Ordem dos Médicos e um alto representante da Ordem dos Enfermeiros: discutia-se competência clínica, triagem de Manchester, asseverava-se o poder e o rigor dos fluxogramas... Pois...
Que posso eu dizer, sem ser médico, sem ser enfermeiro, sem conhecer suficientemente o procedimento de Manchester, sem conhecer os fluxogramas; e sem ter a experiência pessoal das urgências médicas?...
1) Tenho uma irmã médica a quem, muito provavelmente, devo a graça de estar ainda vivo: assinalou-me a tempo a eventual perigosidade de uma manifestação física, visível na minha pele. Subsequentemente, logo a seguir, o médico especialista da situação clínica quase me matou quando, depois de observação direta dessa manifestação física, a desvalorizou completamente, pondo-me na descida vertiginosa, sem retorno, da terrível doença. Por sorte, e a tempo, não me fiei nele.
2) Um dia, um médico estava de serviço à urgência de um hospital. Eu estava num restaurante e o médico estava à distância de uma mesa de casal da mesa em que eu me encontrava. Chamado ao telefone, o médico reagiu visivelmente incomodado ao telefonema que estava a receber, mas tão distraído estava que não se deu conta que poderia ter ali por perto alguém que desse atenção à conversa que estava a ter (ele seguramente conversava com alguém hierarquicamente abaixo dele, no que dizia respeito às responsabilidades do ato clínico, médico). Pondo as palavras a acompanharem uma longa e irritada expiração, o médico rematou a conversa dizendo "Pronto, está bem, eu vou já para aí..." Desligou o telefone, retomou a conversa interrompida com a sua companheira de mesa, pegou outra vez nos talheres e atacou com eles a comida que ainda havia no seu prato, sem sinais de qualquer urgência. Não sei se a "unilateral" conversa que intercetei incomodou mais o médico ou me incomodou a mim.
3) Tenho dois amigos, um casal, que são enfermeiros, e que são amigos extraordinários. São pessoas de uma disponibilidade pessoal e profissional que me dão confiança e tranquilidade imensamente saborosas.
4) Há cerca de dois anos e meio tive uma das noites mais infelizes da minha vida, quando fui à urgência pediátrica do hospital de Santa Maria, para me juntar aos pais do meu neto kosovar, que aguardavam já, dramaticamente afogados nas incontroláveis lágrimas, o veredito dos médicos que tentavam salvar o seu bebé, que atingira apenas um mês de vida. Era o seu primeiro filho. Felizmente, quando a manhã nasceu, nasceu também uma outra alma para os pais e também para mim - a equipa médica conseguiu salvar o bebé!
No caso do meu querido Déon, o momento decisivo - ou melhor, o primeiro momento decisivo - foi o momento em que o bebé chegou à urgência hospitalar aos braços dos pais: enquanto aguardavam angustiadamente a inscrição/triagem do bebé na urgência, de forma absolutamente inopinada, casual, passou ao lado deles um médico que estava de serviço na urgência pediátrica. O médico, sabe-se lá porquê, no meio de outros motivos que poderiam captar a sua atenção, pôs os olhos no bebé Déon. Fosse qual fosse o motivo que o tivesse levado a aparecer ali, naquele lugar, naquele momento, o que todos os que se acotovelavam naquele muito aflito espaço puderam ouvir foi a voz firme do médico dizer: "Este bebé não pode esperar pela inscrição. Este bebé tem de ser visto imediatamente! Levem-no já para ali p'ra dentro!" O desenlace feliz, já o apresentei com a brevidade suficiente.
5) Que posso eu dizer, então sobre o assunto da triagem?... Que, a partir das ocorrências que vivi e relatei nos pontos anteriores, considero que as pessoas - os técnicos, os profissionais -  mais competentes para fazer as triagens hospitalares são aqueles que são capazes de:
5.1) ter o sentido da urgência humana das aflições que levam as pessoas aos hospitais;
5.2) olhar com mais atenção e competência as pessoas doentes que chegam às urgências do que olhar os fluxogramas que os "protocolares" esquemas de triagem mandam ver primeiro que tudo o mais... até mesmo antes da própria pessoa doente.